segunda-feira, 17 de março de 2008

meu velho (e pensam que podem te calar?).

Quem se importa com a política oficial? Eles já ouviram falar em micro-políticas? Sabe, a gente têm contas a pagar, a saúde e os ideais para zelar. O grisalho do cabelo, as noites mal-dormidas, aqueles pingos que teimam em cair dos teus olhos. Eles não sabem que isso conta? Uma vida tecendo uma cidade. Desde o teatro até a pintura do prédio do teatro. Poesias, músicas, educação popular, crônicas e perseguição política. Levar os filhos para abanar quando o Brizola chega ao aeroporto. Pintar uma faixa para a filha de 6 anos carregar dizendo “Fora Collor! Elle quer matar nossa esperança!”. Vestir bota de chuva e reconstruir casas postas a baixo no temporal. E os últimos temporais? Uma antiga estação ferroviária abandonada que vira espaço cultural. Carregar as vigas. Deixar a família de lado por uma cidade cultura. Luzes apagadas? Nós vamos acendê-las, meu velho. Levantar as cortinas que tu ajudaste a colocar lá. O carnaval vai passar na avenida sem ti, tu quem ajudaste a fazê-lo para todos mesmo, mas outros carnavais virão. Diga-lhes que não é assim que se constrói uma cidade. Os sonhos fazem parte da cidade. Os nossos sonhos, o cinema na praça, o cinema no cineclube, os livros vendidos baratos, o dia de natal numa comunidade quilombola, o abraço na rainha gay, os sarais poéticos (desde sempre), a nossa cidade. Florida de ipês, a nossa cidade é feita de sonhos. O cooperativismo, lembras? A solidariedade, lembras? Isso ainda é nosso e vamos repartir com quem quiser e souber querer. A burocracia que se teve que agüentar a gente chuta! Os jogos de poder que tanto irritam a filha anarquista a gente manda para longe! Vivemos sem isso. Sabemos viver sem isso desde quando vendíamos chuchu percorrendo as velhas ruas. Tu conheces as velhas ruas, tu conheces os velhos e os novos dessas velhas ruas. E isso é nosso, é teu, e assim é. Os festivais pelos bairros, o respeitar os outros, o levar lirismo aos outros, o canto do hip-hop, os antigos e os primeiros poemas inspirados, as músicas que falam de uma terra já tão gasta e que continuam cantando por aí, a luta contra a pressa e os descaminhos que ela traz. Esse é o nosso palanque. Esse é o palanque em que eu quero que meus filhos subam. E descer, desceremos apenas as nossas ladeiras com carrinhos de rolimã que tu ensinastes a construir. O resto? O resto é arte. E a arte é maior do que os menores de espírito. A arte é o nosso coreto da praça central. E vamos rodopiar de mão no coreto central. Diga-lhes isto!
Bê.

2 comentários:

mana disse...

O que, calar nosso velho? É mais fácil entrarmos antes em uma nova era glacial....
Teu velho lembra o meu velho. Com certeza Deus jogou a forma no lixo. Uma pena, porque estamos precisando de mais velhos como os nossos nesse mundo mais ou menos.
Putis grila, tô emocionada. Devia ser proibido alguém escrever assim...tão belo.

Ricardo disse...

Ninguém cala a gente e aoa nossos velhos....Ou outros são muito pouco pra isso...Digo-lhes isto!